domingo, 10 de maio de 2009

Um Sonho Quase Impossível


Jovens. A maioria de baixa renda. Grávidas. Cheias de esperança. Esse é o perfil de muitas candidatas à mãe, viventes na periferia recifense. Parte delas – 36 atualmente, todas residentes na capital pernambucana – integrantes do projeto Colméia, mantido pela Associação Espírita Casa dos Humildes.

A dura realidade cotidiana se mistura com a alegria e a esperança vivida com a gravidez, longe do (cada vez mais freqüente) desejo abortivo. A certeza da bênção que é gerar uma vida no próprio ventre. O conforto de contar com a ajuda de gente abnegada, que semanalmente se reúne no referido centro espírita com o único propósito de servir.

Estimuladas a escrever uma carta para o filho que ainda vai nascer, elas demonstraram um elevado senso de percepção da realidade. “Sabe filho (...) Na verdade, eu não esperava por você. Você veio no momento mais complicado da minha vida. Fiquei desesperada porque não sabia como aceitar você”, palavras de Dulciléa Lopes, 32 anos. “Com a ajuda dos meus amigos pude entender que você é especial (...) Me desculpe pelas tristezas e choros e dizer que eu não sou feliz. Mas é que a vida não é como queremos (...) Por isso, filho querido, seja bem vindo ao nosso lar, porque estamos à sua espera (...) Mamãe te ama, meu amor. Eu vou cuidar de você com muito carinho”.

As dificuldades financeiras, ainda que se mostrem obstáculos difíceis, não desanimam essas futuras mamães, como Karine Rodrigues, 22 anos. “Eu e seu pai estamos muito alegres e te amamos muito, mesmo antes de você nascer (...) No momento não temos condições de comprar todas as coisas que um bebê precisa, mas eu estou na ‘Colméia’ e seu pai está fazendo uns bicos pra comprar um berço, guarda-roupas e algumas coisas. Seus avós também ajudam. Mesmo com todas as dificuldades não vamos deixar nada faltar para você (...) Estamos muito ansiosos pela sua chegada”, escreveu.

Outras integrantes do projeto mostraram sensibilidade para ilustrar essa realidade. “Quando fiquei sabendo da sua chegada, não pude conter a minha alegria de saber que havia um ser em meu ventre (...) Jamais imaginei que sentiria essa alegria, pois, devido a problemas de saúde, achava que jamais poderia ser mãe”, expressou Andressa Ruscele, 16 anos. “Agora eu vejo que para Deus nada é impossível (...) Quando você nascer te levarei, meu filho, à casa do Pai, pois eu prometi isto a mim mesma. Quero te colocar entre minhas mãos e te levantar próximo a Ele. Quando isso acontecer, direi a Ele: ‘Pai, este filho é mais teu do que meu. Toma conta dele quando eu não estiver mais aqui”.

As cartas dessas mulheres (e de mais outras 23 gestantes) integraram um concurso literário, vencido por Karine Rodrigues (cujo trecho da carta está reproduzido acima) e promovido pela equipe que comanda o projeto, no qual este que vos escreve participou como jurado. Mais que letras dispostas num papel, permeadas por erros de português, mas inspiradas pela vida, os depoimentos revelaram que ser mãe no Brasil é uma realidade complexa – e para muitas mulheres, sem dúvida, um sonho quase impossível.

COLMÉIA- A Colméia Fraterna Yvone Pereira funciona há 14 anos na Associação Espírita Casa dos Humildes. De natureza filantrópica, o trabalho tem o comando de Zildete Pimentel, dona de casa que dedica grande parte do seu tempo ao projeto. E ela divide essa responsabilidade com outros 24 voluntários, dentre psicólogos, médicos, donas de casa e outros profissionais, que são carinhosamente apelidados de ‘abelhinhas’.

Os trabalhos compreendem atividades lúdicas, educativas e de lazer, além de oficinas. Tudo visando os enxovais, que são doados às próprias participantes. Lá, as gestantes ganham pontos nas tarefas desenvolvidas, bem como nos procedimentos pré-natais. “Ultrassom, consultas médicas regulares e cartão de vacina também contam pontos. Todas as alunas recebem peças para o enxoval, mas as que mais pontos somam ganham presentes outros, como banheiras e cestas básicas”, revela Zildete.

Mais que presentes e doações, as gestantes têm acesso a informações educativas, atividades manuais (como pintura e bordado) e orientação moral. “Aqui não importa a religião. Elas participam cientes de que estão colaborando com os enxovais umas das outras e mostram muita garra para aprender e participar”, explica Zildete, que define o objetivo maior à frente da Colméia: “Procuramos olhar o ser que estar para nascer e a gestante enquanto mulher, mãe, companheira, filha. Buscamos valorizar a pessoa. Queremos que ela saia daqui levando uma nova imagem de si e da própria vida”, concluiu.

SERVIÇO:
Colméia Fraterna Yvone Pereira – Associação Espírita Casa dos Humildes
Rua Henrique Machado, 110 – Casa Forte – Recife-PE
Informações: 3268.3954