terça-feira, 16 de setembro de 2014

Quedante


Foi quando ela quis voar. Jogar-se da sacada de seu luxuoso apartamento, no último andar. Uma torre alta, à altura de uma mulher em altos apuros. Não havia mais o seu querer por um mundo sem calma, um casamento sem cama, uma profissão sem gana, uma vida sem alma. Coragem ou covardia? Todos haveriam de se questionar. Mas de que diachos serve o dizer alheio? Danem-se! Voar soa melhor do que sofrer! Ser está muito além desse insosso viver! Há, sim, força no meu voar! Os pés no parapeito. O sopro invisível a tremular os seus cabelos. O buraco negro da noite a lhe fitar. As pequeninas luzes muito abaixo de si. A imensidão do universo muito acima da sua pequenez social. Era a hora. Os olhos se fecharam. As pernas tremeram. Voar é, sim, melhor do que sofreeeerrrrr... O mergulhar no vão da vida foi-lhe mais prazeroso do que pensava. Mas somente por ínfimas frações de segundo. Constatar-se desprovida do poder da própria vida doeu. Mais. Deu-lhe consciência. Mas... E agora? “Meu corpo cai!”, gritou. “Vai-se o corpo meu!”, compreendeu. A força da gravidade contrastando com o peso de suas palavras, pensadas e emitidas com urros inaudíveis para o resto do infinito. “Mas...”, pensou. “Eu tenho alma... EU TENHO ALMA!!!”. O corpo, contudo, continuou a cair. E foi caindo. E os seus olhos abertos enxergaram o asfalto cada vez mais próximo. E os seus olhos fechados esperaram a dor do fim. E o bater no solo a fez abrir os olhos. Em sua cama, o abrupto acordar foi-lhe alívio. E o suor nos lençóis parecia lhe dizer: tens corpo. E ALMA...

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Pobre Paixão


Lidar com a política como se lida com o time de futebol, ou com a religião que abraça, ou com qualquer outra escolha em que se coloca a paixão acima da razão é... Escolha. Infeliz. Voto também é escolha. E toda escolha requer razão. E toda paixão acima da razão ilude, divide, empobrece.

Não me interessa em quem votas. Nem a ti em quem votarei. Disseminar calúnias, informações dúbias ou encher o outro com excessivas informações sobre qualquer que seja o candidato é querer impor a própria opinião. O povo brasileiro não se cansa de se repetir. De se perpetuar trouxa nas mãos de espertalhões.

Na internet, a manipulação é oficial. Pessoas de idades e formações variadas são contratadas (isso mesmo: pagas) para produzir informações (verdadeiras, falsas ou tendenciosas), comentar publicações e disseminar interesses nas Redes Sociais, em Blogs e Sites diversos. Via e-mail também. E tantos debates acalorados são, assim, direcionados. E tantas opiniões manipuladas. E tantas pessoas ignoram todo esse jogo de manipulações. (e não vou nem citar aqui a TV e o indefectível Horário Político)


Eis aí, no âmbito nacional, três propostas um tanto distintas na teoria, mas tão semelhantes na prática: grupos querendo se perpetuar ou retornar a ocupar o poder. É pra votar? Está bem. Do jeito que está, escolhamos as opções menos ruins. Agora querer fazer do pleito a panaceia de sempre, justificada por pseudodiscussões ideológicas é... Escolha. E eu mantenho a minha. Calo. E voto – confesso, um tanto injuriado. Novamente.

domingo, 17 de agosto de 2014

A Educação dos Urubus (Ou Não)


Primeiro foram carros de som nas ruas convocando o povo. E chamadas na televisão com idêntico fim. Depois foi a multidão invadindo as ruas. Amanhecendo nas vias da cidade do Recife em grande aglomeração. E seguindo num domingo agitado, com direito a missa campal.

Aplausos. Choros de anônimos. Gritos de “guerra” – também partidários. Cantos religiosos. Pessoas fantasiadas. Demonstrações de amizade com quem sequer se era conhecido. Flashs em demasia. A TV explorando closes impensáveis. Selfies sorridentes junto ao caixão – ou com a viúva. Vaias. Discursos repetitivos. Declarações exageradas que alçavam um homem público a condição de santo. Teve até apresentação musical. E foguetório.

(Ah... Sim. Tinham também familiares e amigos próximos nessa cerimônia de despedida, transformada por muitos num evento festivo – a força de uma família que enfrentou a tudo e a todos com força e dignidade).

E enquanto constatamos, de um lado, uma comoção pública, vimos excessos transmitidos ao vivo. A simplicidade de um povo entristecido contrastando com gente anônima (e também famosa) querendo aparecer em rede nacional. Uma falta de bom senso misturada com o desejo de se despedir de uma figura pública recentemente falecida, de forma trágica e misteriosa. Um show de antagonismos.

O que significa tudo isso? Apenas um povo simples misturado com uma multidão sem preparo para determinadas ocasiões. É a educação dos urubus (aqueles que se aproveitam sempre para aparecer, não importando o luto). É o ainda despreparo da mídia para focar no que deveria ser realmente focado (e, em muitos casos, o mero interesse na audiência). É o uso político em momentos em que não se cabe. É, enfim, o paradoxo de um país ainda jovem que não sabe lidar com determinados fatos marcantes de sua história.



OBS.: talvez toda cerimônia de despedida devesse ter mesmo todos esses ingredientes que vimos no velório e enterro de Eduardo Campos. Ou não...

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Falsa Traição


Era só uma madrugada fria... Foi quando me perdi tentando te encontrar. Decidiu dormir a lua. Tentou o sol acordar. E eu, na vã tolice minha, ignorei-te em mim, traí-te com a aurora, perdi-me a te buscar...

domingo, 6 de julho de 2014

Retrato


Era só uma fresta. Um feixe na fresta. Luz violando aquela brecha. Não havia vazio naquele coração aquebrantado. Trôpego, sim, mas iluminado. Luz de um flash de quem ama. Retrato de todos os amores inacabados. Era só uma fresta no meu peito. Violada pela luz de mim mesmo. Só uma luz. Só uma fresta...

domingo, 29 de junho de 2014

Sobre Vivente


O verbo rasgou o ar
E feriu os sentidos,
Manchou a serenidade
E agrediu os ouvidos,
Fingiu ser palavra
E mostrou-se perigo.

A língua fez-se faca
E entre adjetivos
E conjunções malfadadas
Encontrou no sujeito abrigo.
Pobre gramática esta...

Ainda bem que estou vivo!

sexta-feira, 30 de maio de 2014

O Mundo de Clara


Clara, de repente, espelhou-se só. O mundo inteiro ao seu alcance, mas foi na dor que ela encontrou a solidão. Mergulhou em si. Saber enxergar-se é como a dor. Um dia o momento chega e apequena o mundo nas próprias mãos. Aquele mesmo mundo inteiro que parecia infinito. Aquele sem defeitos e que de tão perfeito fez-se no sorriso dele traição. Clara chorou. Sorriu. E adormeceu...

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Adeus, Harmonia...


A Rua da Harmonia já foi harmônica.
A Rua da Consolação anda desconsolada.
A Rua Imperial, avassalada.
A Ponte do Limoeiro, enegrecida.
A Avenida do forte, enfraquecida.
A Rua da Lama, atolada.
O Cais do Porto, desatracado.
O Marco Zero, zerado.
O Rio Capibaribe, aterrorizado.
O Largo da Paz anda perturbado.
A Rua Nova se mostra envelhecida.
A Avenida Boa Viagem há muito se foi.
A Praça Chora Menino agora vela a cidade.
E o Recife, que um dia somente arrecifes foi, arrefece ante o mergulho no próprio caos urbano.

Adeus, harmonia...

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

"Eita Povinho Bunda!"


O título desta crônica, devidamente aspado, é fruto das esculhambações humorísticas do Casseta & Planeta na década de 80. Lembro como se fosse hoje, numa revista semanal, de ter me deliciado com a arte de uma camisa branca com a bandeira do Brasil estampada à frente, cuja citada frase substituía a “Ordem e Progresso” do pavilhão nacional. Eu era só um garoto, mas nunca esqueci a força que o humor inteligente tem. E foi essa imagem que me veio à mente após a polêmica camisa da Adidas (imagem acima), alusiva à Copa do Mundo de Futebol a ser realizada no Brasil. Em ambos os casos, apesar da larga distância entre um produto de humor e outro meramente comercial, a bunda se sobressai em significados vastos.

Ela (a bunda) é, talvez, o maior símbolo do Brasil. Aqui e no exterior. Não é só um mero fetiche. Ela representa o sexo fácil, imagem maior que grande parte dos estrangeiros tem do país e que muitos de nós mesmos também temos – e que “vendemos” pra quem quiser “comprar”. Vide conteúdos diversos exibidos (e prestigiados) em nossos canais de TV (dos BBBs da vida aos apelos carnavalescos e às peças publicitárias - quem lembra, para ficar num exemplo só, uma propaganda recente das sandálias Havaianas em que um casal estrangeiro decide ir ao Brasil em férias e a mulher, ao ver uma foto de uma bunda num anúncio brasileiro, decide mudar de roteiro? Vou nem citar as propagandas de cerveja e outras mais), as garotas e garotos oferecendo seus corpos nas esquinas das nossas movimentadas ruas, os bailes funk, as baladas (em todas as regiões e classes sociais)... Encontrar sexo é mesmo muito fácil por essas bandas.

Você pode argumentar que isso não é exclusividade nossa. Bom, nessa intensidade, estamos entre os “primeiros”. Além das já citadas facilidades para se fazer sexo no país, somos “referência” em prostituição infanto-juvenil e estamos entre os países mais “bem colocados” quando o assunto é turismo sexual.

Devido ao zum-zum-zum gerado, a Adidas decidiu cancelar a venda da polêmica camisa. Pega mal dizer certas verdades (ainda que, por outro ângulo, a mensagem estampada na blusa represente estímulo ao turismo sexual, esse mesmo que o Brasil é referência). Incomoda-nos ver como o mundo enxerga essa grande bunda que o Brasil tem feito questão de exibir – seja pelo sexo fácil já explicitado, pela corrupção descarada que abundalha a política nacional, pelo caos urbano que teimamos em dejetar, ou por tantas outras questões que nos fazem de verdadeiros bundões. A camisa provocou repúdio nas autoridades porque teimamos em não querer enxergar nossas próprias mazelas. Causou ojeriza em muitos cidadãos brasileiros porque não assumimos que nós mesmos somos tão passivos, verdadeiros bundões, em lidar com essas e muitas outras mazelas no dia-a-dia.


Ouso dizer que, ainda que um tanto agressiva, a camisa da Adidas é perfeita. Assim como a antiga do Casseta & Planeta. Para um país ímpar como o nosso, com tantos atributos positivos que poderiam nos transformar numa verdadeira potência, a bunda anda mesmo sendo a nossa cara. E enquanto a Copa do Mundo não chega e o Carnaval já está batendo em nossa porta, em nome da “alegria” vamos nos “desbundar”. E continuemos vestindo o fio dental... Ops! A carapuça...

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Aos Porcos, a Pocilga!




“A internet é o maior território anarquista que já existiu”. Perdoem-me, mas não lembro onde li essa frase. Sem fonte, mas com a plena convicção de que o universo virtual se instalou na vida moderna com uma força imperante, concordo com a afirmação aspada acima, ainda que enxergue esse território quase sem lei como uma mera extensão do nosso cotidiano social – ainda mais quando realçamos, nesse contexto, as redes sociais.

Mas deixemos o fator anarquismo de lado. Pensemos nas citadas redes. Mais especificamente no tão ‘amado’ e ‘odiado’ Facebook, que chegou realçando a característica anarquista da internet com sua gratuidade, mas que enfraqueceu o mesmo conceito quando, de forma cada vez mais frequente, ao que parece, passou a policiar algumas publicações lá exibidas – estou, evidentemente, deixando de lado outras tantas questões que a transformaram numa gigante capitalista.

Mas deixemos o fator policiamento (e tantos outros) de lado. Pensemos no que significa ter um perfil numa rede social. Voltemos ao conceito de extensão do cotidiano real. Pronto. Aí é que encontramos a natureza humana por trás do ‘amor’ e do ‘ódio’ ao Facebook. Espelho interessante do que somos no dia-a-dia.

Relacionamentos virtuais não são, absolutamente, iguais às relações presenciais. Expor na citada rede dores ou alegrias, defeitos ou virtudes, conquistas ou derrotas não coloca ninguém em situação diferenciada. O hipócrita na vida real amplia sua hipocrisia nessa rede. O mentiroso se encaixa melhor no âmbito virtual. O carente se apega ainda mais no conforto da virtualidade. O bom encontra terreno aberto para se propagar, assim como o mau. E por aí vai, afinal, a grande diferença é a facilidade de se esconder por trás de uma máquina (assim como por tantas vezes nos escondemos sob máscaras).

“Amar” ou “odiar” um instrumento virtual de socialização nada mais é do que uma forma de exteriorizar a própria forma de ser. Quem ‘ama’ o faz por adorar expor a própria vida, ou por achar interessante se relacionar com outras pessoas (muitas que nem mesmo conhece), ou ficar por dentro das coisas (interessantes ou não) que circulam, ou pelo dinamismo na comunicação etc. Quem ‘odeia’ o faz por detestar o excesso de “felicidade” que por lá circula, ou por outras hipocrisias reinantes, ou ainda pelas manipulações que alguns promovem em posts dos mais diversos... Mas, pergunto: e tudo isso não encontramos também no cotidiano da vida ‘real’?

Sim, as redes sociais são meramente uma extensão da vida social humana. Assim como na vida diária, também na vida virtual é preciso saber conviver, afinal, a afinidade é que norteia as escolhas pessoais de cada um. Aos cordeiros, pasto verde e iluminado. Aos porcos, a pocilga!

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

A Falsa Democracia

“Posso não concordar com nenhuma palavra do que dizes, mas defenderei até a morte o teu direito de dizê-las”. (Voltaire)




Não, você não sabe o que é democracia. Nem eu.

A falsa democracia é moda eterna. Rachel Sheherazade, jornalista do SBT, que o diga. Tendo espaço para dar opinião própria num telejornal, não poupa palavras para criticar o que acha errado, assim como para elogiar o que acredita ser louvável. Opiniões pessoais. Nada demais, não fosse a já citada distorcida forma de exercer-se numa sociedade que se diz democrática.

A última polêmica foi o comentário acerca do ladrão carioca que foi preso nu a um poste por populares, enquanto a polícia chegava para fazer a prisão. A imagem é absurda (foto). A ausência do Poder Público, também. E a opinião da jornalista foi incisiva, defendendo a ação dos cidadãos quando o tal Poder Público não se faz presente – o que chamou de legítima defesa coletiva (além de menosprezar o jovem da foto, o ladrão, chamando-o de ‘marginalzinho’). Por se expressar dessa forma, foi achincalhada. Certas opiniões devem ser medidas antes de serem exteriorizadas (ainda mais em se tratando de um telejornal), mas democracia é democracia. Não há meios termos. Uma opinião apenas é. Aceitá-la é-nos obrigação, ainda que não se concorde com ela (até porque, nesse caso, não vi ninguém se preocupar de verdade com a situação social do ladrão em questão!).

Pra mim, fazer justiça com as próprias mãos, como ficou subentendido na opinião da moça, é reprovável (ainda que concorde plenamente que o Governo tão pouco venha fazendo para minimizar os problemas da segurança pública no país), assim como sou contrário a atos de humilhação como esse a que o ladrão foi exposto (ainda que não concorde absolutamente com crime de roubo ou de qualquer espécie), mas que direito tenho de cercear o direito de opinião alheia quando eu mesmo expresso aqui o que penso?

A questão é recorrente. Na época das manifestações populares generalizadas (sim, na época, pois já passou, o gigante dormiu...), as redes sociais ficaram recheadas de intolerância. Os ‘mobilizados’ desciam a lenha em quem se expressava contra – quem defendia o direito de ir pra rua expressar sua indignação repreendia o direito do outro de discordar. Exemplo vívido de intolerância. E é essa mesma intolerância que simboliza essa falsa democracia e produz todos os preconceitos e desarmonias. Não aceitamos o diferente. Não aceitamos o que destoa do que pensamos. Vivemos como se fôssemos deuses na arte da crença. E, assim, só nos apequenamos diante dessas demonstrações cabais de antidemocracia.

O caso de Rachel Sheherazade vale para qualquer cidadão (Jair Bolsonaro, Marcos Feliciano, Danilo Gentili, você, eu...). Expressar-se é um direito. Os excessos, claro, aqueles que ferem as leis vigentes, são passíveis de enfrentamento legal. Mas não esqueçamos que a democracia é a grande lei num ‘estado democrático de direito’. Ou deveria ser.

...

OBS.: não concorda comigo? Tudo bem...

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Ela e Eu


Afogada no diurno período
Vens à superfície
Apenas me olhar.

Luminária minha...
Quantos dourados
Teu prata contém?

És tu, lua,
Minh’alma nua
No céu a brilhar...

És o divino em mim
Brincando de deusa
Sobre as águas do mar...


. . .

(A lua cheia nascendo na fantástica Praia dos Carneiros, em Tamandaré-PE, no dia 17/01/14  |  Foto: João Melo Neto  |  Poesia: Sidney Nicéas)

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

O Enterro de Nós Mesmos




Em dois meses, três pessoas queridas a mim faleceram. Não fui a nenhum enterro. Em um caso, fui ao velório (muito mais para cumprimentar familiares e amigos). Todos três receberam minha atenção interior e minhas vibrações de amor, mas nenhum corpo morto recebeu a minha presença. Já fui a enterros (e, claro, deverei comparecer a outros), mas não gosto da equivocada ideia de “despedida”. Despedida da carcaça. Não gosto. O apego ao corpo é um conceito equivocado.

A vida humana é assim. Corpos conhecidos vão padecendo. Almas amigas vão retornando pra casa. E deixando, aqui, outros corpos, perdidos, que perpetuam uma cultura mórbida. E quando os defuntos são ditos famosos, o excesso é contundente.

O que dizer dos velórios (quase) intermináveis de Dominguinhos, Nelson Mandela e Reginaldo Rossi (isso pra ficar somente em exemplos mais recentes)? Desconhecidos emocionados pela imagem, já que, em sua esmagadora maioria, não conheciam os finados em questão. Pessoas simples, muitas delas, acreditando-se menores do que os tão badalados corpos em exposição - cujas visões são moldadas apenas pela mídia. Um culto ao corpo que, numa análise fria, nada mais é do que uma mórbida cultura, repito, de valorizar o que não tem valor (sim, Dominguinhos, Mandela e Reginaldo Rossi, assim como qualquer outro ser humano, eram muito mais do que seus corpos enrijecidos).

A desgraça atrai. A morte é ímã. Funerais parecem o ápice desse ‘urubuzismo’ humano em torno da fragilidade corpórea. O medo de morrer da maioria soa controverso diante dessa longínqua e repetitiva morbidez. Fico somente a imaginar-nos no enterro de nós mesmos, tentando compreender a própria cegueira nossa ante o imaterial. Só imagino.

Num planeta onde seus habitantes mais ‘inteligentes’ cultuam o corpo como meta suprema, eis uma crônica de um mundo que mais parece uma salada de ignorância (salada essa que só emagrece moralmente). E enquanto o meu corpo envelhece aos poucos, preparando-se lentamente para voltar ao pó, sigo tentando ser mais alma (a minha porção perene!), errando, claro, mas tentando fazer a diferença aqui e acolá e olhando a mim e à minha volta com uma verve incisiva. É só o que me resta...

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Os Dedos Por Trás da Língua




Entre a língua
E a mente
Existe um vão
Imensurável,
Cavidades existentes
Pelas mãos movidas.
A virtual distância
É-me real,
Presilhas mentais
Por mim acionadas,
Movendo dedos
Por trás da língua.
Escrevo, então...