João é um cara arretado. Recifense nascido no Morro, negro, pobre, filho de uma honrada empregada doméstica, cheio de irmãos e um coração daqueles, enorme, refletido num sorriso que lhe é peculiar. Homem de caráter reto, está crescendo na vida através do estudo e do esforço no caminho da honestidade.
Parauapebas é uma pequena cidade do Pará, localizada há 700 quilômetros da capital Belém. O local tem recebido uma massa de trabalhadores oriunda de várias regiões, atraída pela oferta de emprego. São grandes empresas explorando o rico solo da região, fazendo crescer as oportunidades e, principalmente, os próprios lucros.
João chegou a Parauapebas por vias profissionais. Após obter bom desempenho numa multinacional – que o levou inicialmente ao sul do país –, foi transferido para a cidade paraense a fim de atrair novas possibilidades para a empresa. Ele não precisava tanto de Parauapebas, mas ela, sim, precisava muito dele. E foi numa noite de lua nova que ele descobriu isso.
- O mundo é do dinheiro, o senhor sabe.
Falou mansamente o Sr. Antônio, que bateu à sua porta por volta das 19 horas.
- Não entendi, Seu Antônio.
- Tá vendo aquela moça ali, Seu João? É Suzete, minha filha. Tem só 17 aninhos e já sabe o que quer da vida.
João permaneceu a ouvir. Seu Antônio continuou.
- A gente pode fazer negócio, doutor. A filha é minha, mas eu posso dar ela pro senhor. A gente negocia dois salários por mês, coisa e tal, e ela pode se casar com o senhor ou sei lá mais o quê...
O sorriso, que sempre foi uma constante, desapareceu do rosto daquele nobre cidadão. A realidade se confundiu na sua cabeça e o olhar para a bela morena o fez reagir.
- O senhor pára logo por aí. Não pense que eu sou como muitos dos canalhas que chegam aqui para explorar vocês. O senhor não tem vergonha de ‘vender’ a sua filha não? Pois bem! Acho melhor o senhor sair já daqui!
Seu Antônio emudeceu. Estranhando a atitude “daquele negrinho metido a besta”, deu as costas e se foi, levando com ele a filha e um pedaço da esperança que sempre foi vivente no agora decepcionado homem.
A história de João se cruzou com a de Suzete numa pequena cidade do Pará. A realidade é mesmo dura. Parauapebas poderia ter acordado no dia seguinte com mais uma ocorrência de descaso familiar. Mas João é mesmo um cara arretado. E Parauapebas continua precisando muito dele.
* Essa é uma história verídica, cujos nomes foram modificados. Uma triste realidade em várias cidades brasileiras...
Uma triste realidade, sim, mas nem tão triste se a gente se lembrar da existência de João. O bom caráter ainda existe e, como a esperança do texto anterior, nunca vai morrer.
ResponderExcluirRoberta Tavares
Poxa Sidney, triste realidade essa não é? E outra mais que conhecemos bem!
ResponderExcluirParabéns pela abordagem e pelo delicado trato das palavras!
Ps. Esqueceu o barraco foi? Hum!
Bjs
Beleza Roberta! Valeu Luiza! (esqueci não viu? Foi a correria, mas vou me atualizar...) :)
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